Rascunhos

MINHA GERAÇÃO

Essa amargura
Que me faz um homem rude,
É mera atitude
De defesa.
Odeio a pobreza
Que aos pés de Deus se ilude;
Enquanto a juventude,
Nada almeja.
Desprezo a mania de grandeza
Que o rico tem com tudo.
Não sou um carrancudo
Por frieza;
Somente faço uso
Da tristeza
De um sisudo,
Por ser fruto
De uma geração que aceita.
 
 


ENTRE CORPOS NOS QUINTAIS
 
Os que lutam pela liberdade
Estão atrás das grades.
Estão em guerra,
Os que lutam pela paz.
O que faz
Aquele que os menospreza?
Será na certa,
Destaque nos jornais.
Estão loucos,
Os que buscam ideais.
Talvez mortos,
Entre corpos,
Nos quintais.
CENÁRIO

O que falta para te fazer feliz?
O que você diz,
Parece não me preocupar.
Tantas vezes vou tentar,
Quantas sejam necessárias.
Neste cenário,
O melhor ator em cena
É o que pensa
Antes mesmo de atuar.
Tento entender
O que vai dizer você
Antes mesmo de falar.

UM ANJO

Tenho a sensação
De que encontrei um anjo;
Por milhões de anos,
A chorar.
Sinto que me ama,
Ao tocar sua pele clara
Onde o sol ofusca meu olhar.
Ele não tem asas.
Mas pode voar
Nos mais belos sonhos,
Onde eu o amo
Num eterno  mar.


ENTRE ESPADA E PODER

Linda criatura,
Os teus olhos são a cura
Para o meu ser.
Nem tento viver
Sem tua ajuda,
Minha armadura.
Entre espada e poder,
És minha jura
De novamente nascer.

VOA PRA CASA

Volta no tempo,
Batendo asas.
Voa pra casa.
Volta pra mim.
Não há um fim
Para quem casa,
Só a desgraça
De achar que sim.




NO MEU ROSTO

Pelos meus olhos,
Não sei se sou louco
Ou serei outro
Que não quer se achar.
Perdi meu ar
De bom moço.
Perdi meu gosto
De amar.

Pelos meus olhos,
Não sei se sofro;
Se, é de desgosto,
Esse meu pesar.
Eu tento ver no meu rosto,
Se ainda é pouco,
O que há.

OS IDEAIS

A minha arma
Contra esses generais,
É nada mais,
Que uma caneta esferográfica.
Enquanto eles atiram com 
seus canhões,
Eu registro suas ações
E as publico nos jornais.
Pobres mortais
Que vivem de ilusões,
Torturando nos porões,
Os ideais.



FRÁGIL ESPERANÇA

Não há tristeza que não se dissipe
Ante o sorriso de uma criança.
Na mais frágil esperança,
Não se desiste
E se resiste,
E se alcança,
Se comemora com dança,
E se demonstra
Que existe.
 

VERBO INDOMÁVEL

Às vezes, eu esqueço
Que estou preso
A esse corpo miserável.
Mas sem ele, sou escravo
Da fatal inexistência.
Metamorfoseando minha crença
De não ser hereditário
De uma lenda,
Não sou apenas
Carne habitável,
Sou verbo indomável
Em dilema.
SONETO DAS MENINAS

Uma criança embala
A outra criança que chora.
Uma tem fome estampada,
A outra uma longa história.

Uma sorri desdentada,
A outra, de urina se molha.
Uma é mãe desnaturada,
A outra a culpada da hora.

Ambas, frutos da desgraça.
Duas almas condenadas
A uma vida de esmola.

Mãe e filha, assim ligadas,
Tangem as suas passadas
Presas por laços de corda.

  

MUITO POUCO

Descobri que enfim,
sou outro,
Pois de mim,
sou muito pouco
Para ser completo em mim.
Se não sou em mim,
eu mesmo,
Quem seria eu, sem ser
Esse outro que há em mim?











CANTIGA

Todos os dias
É a mesma luta,
É a mesma lida.

Cama arrumada,
Feita a comida,
Roupa lavada,
Casa varrida.

Eis a cantiga
Da dona de casa,
Que inabalada,  
Luta com a vida.


CORPO E ALMA II

Eu ainda sinto falta
Das duas horas no céu.
Ela louca, desvairada.
Eu um pagão infiel.
Duas almas condenadas
Pelo fogo da paixão.
A minha se entregava.
A dela dizia não.
Ela se entregou a outro.
Eu para a terra voltei.
Ele desfruta do corpo
Que eu nunca mais terei.








MEU PASSADO

Tenho nas mãos, o meu destino;
Salvo os desvios do acaso
Que em meu encalço,
Possibilita o meu caminho.

As probabilidades vão seguindo
Os acontecimentos dos meus atos
E pelas evidências, construindo
Um mundo quase extinto,
O meu passado.






















EPITÁFIO XLII

A serenidade do ambiente
É magnífica.
A solenidade se alimenta
De vida.
O cemitério
Tem por mérito,
A morte.
Enquanto por sorte,
Passadas entre covas,
Minhas horas
São de luto.
Eu quase não escuto
O badalar do sino.
Meu caminho
É por descuido.
Talvez no fim de tudo,
Eu suporte
A minha própria morte.



É VOCÊ

Sonhe pela possibilidade
Que na espontaneidade
Tudo pode acontecer.
Acreditar é poder
Transformar em realidade,
O objeto que anseia, o querer.
Vá além do sonho.
Esse mundo tão estranho,
Na verdade,
É você.










DELITO

Meu delito
Está no riso
Disfarçado;
Não por eu ter violado
Uma lei.
Já não sei
Se ainda, sou culpado.
Assustado
Com o risco de talvez,
Ser julgado
Pelo erro de vocês.







 
DEDO EM RISTE

Sem você,
O meu mundo não existe.
Não porque me sinta triste
Ou esteja em solidão.
É meu velho coração
Que demasiado insiste
Em viver de emoção,
E dedo em riste,
Me acusa de egoísmo e ambição.
O que faço sem você
Ante tal situação:
Se meu coração desiste
De bater?
O meu mundo não existe
Sem você.





O EXPERIMENTO

A forma definida em pensamento
Torna-se real.
Eis a idéia material
Em movimento.
O velho camundongo passa o tempo
Sendo escravo irracional
Do seu silêncio,
Roda o experimento,
Gira a roda sem lamento,
Gira a vida dentre o caos.








 
 
MINHA LETRA

Ciente de que a vida é passageira,
Estreito minha fé no dia-a-dia.
Procuro inserir a alegria
Entre versos de tristeza.
E é observando a natureza
Que encontro um instante de euforia.
No mais sutil momento,
Há grandeza.
Na extrema beleza,
Harmonia.
Tal qual o sol, a terra, irradia,  
A poesia
Ilumina a minha letra.





 
 
AS CARICATURAS

Os rostos dispostos
Em caricaturas,
Por finas ranhuras
Se desalinhavam.
Ainda encantavam,
Modestas figuras,
Ainda encantavam.

Estavam pintadas
Até certa altura.
O vento e a chuva
As desfiguravam.
Mesmo as que estavam
Nas partes mais sujas,
Se eternizaram.





 

 
AMPULHETA VIRADA

Corre a mão esquecida
Pela folha dobrada.
Era a última carta
Que seria emitida.
Um sinal de que o dia
Pela noite ansiava.
Ampulheta virada,
Não há tempo pra nada
Nessa vida.














INDESEJADA

Ela se aproxima de repente,
Toca a minha mão,
Prova a sopa quente
E um pouco do pão.
Cruza as pernas delicadamente,
Me deixando ver sua intenção.
Minha reação
De nojo crescente,
Ante a indecente situação,
Leva a outra ação:
Levantar o braço lentamente
Para evitar o que pretende,
Quando vem em minha direção.
A maldita mosca tenta em vão,
Evitar a morte iminente.
 

 


FAÇANHA

Uma pessoa só,
Pode mover montanhas.
Na certa, o acompanha
Um enorme trator
Ou quem sabe, é condutor
No leva-e-traz da caçamba.

Que façanha
Pode um homem de valor,
Com dedicação e amor,
Claro, um monte de grana.
A fé remove montantes
Em valor.

 


À DERIVA

Posso até perder o brilho dos meus olhos,
Mas jamais, deixar de ver tanta tristeza.
No esbanjar de pratos sobre minha mesa,
Vejo a fome refletida nos teus olhos.

O que faço se estou preso ao sistema
Onde a indiferença
Sobrepõe a caridade,
Onde a verdade
É varrida
Pra debaixo da mentira
E onde a vida
É um barco à deriva
Sem ações de piedade?


  
A MOCINHA

São os 17 anos mais lindos que eu já vi,
Nos olhos, na boca e no nariz.
Uma pele que cheira à distância.
No cabelo não tem trança,
Mas um brilho na raiz.
Na protuberância,
Seios de infância.
Quieta, ela alcança
A minha atenção.
Disponho na mão
Com uma caneta,
A sua frieza.
Seria então,
Tristeza 
Ou apenas solidão?




 
MERA CRIAÇÃO

É assustador
Um mundo no qual o terror
É fruto da religião.
Eis a razão
Pra que eu defenda o valor
Da vida pela evolução.
Na contramão,
Eu sigo tentando expor
A minha incômoda opinião.
Se somos mera criação,
Então, quem fez o nosso criador?


DE SI MESMO

Na estética,
Talvez, estejamos desfeitos.
Na moral e na ética,
Somos os mesmos.
Dentro de nossa cabeça,
A aparência, não esqueça,
É a voz do pensamento.
E a cada vão momento,
A idade se prolonga,
Nosso corpo fica horrendo,
Nossa mente se encontra.
Entre a experiência e o medo
De perder-se no espelho
Da senilidade,
O homem sente saudade
De si mesmo.




AO CAIR DA NOITE

A noite cai.
Fecham-se portas e janelas.
Ninguém mais sai.
São apenas os ais
De suas novelas.
Pois lá fora,
A essa hora,
O perigo os espera.
Quando amanhece, se revela
Nas colunas dos jornais,
Crimes brutais
Nas ruas próximas às favelas.
Quem são os tais?
Quem eram elas?
A resposta,
Sempre suposta,
Não interessa.



MATRIZ

Qual é a raiz
De meu problema?
Em que teorema
Me desfiz?
Sou um aprendiz
Que sempre tenta
Na razão de seu dilema,
Encontrar sua matriz.













ENFRAQUECIDO

Não tenho medo da morte,
Eu a respeito.
A morte
Bate forte
No meu peito,
A procura de abrigo.
Tê-la como a um inimigo,
Não desejo.
A morte
Mais que posse,
Tem direito
Ao meu corpo enfraquecido.




















SOMOS NÓS DOIS

 Saímos de casa a sós, A procura de nós mesmos. Encontramos um ao outro, Sem temores, nem segredos. Na união de nós dois, Vislumbramos um ca...