sexta-feira, 27 de setembro de 2013

O galo


          
                                                                               
          

          O galo canta ao azular do céu, de sobressalto eu me acordo. Quantos dias mais terei pela frente com esse madrugador barulhento?
         Ele continua lá fora com o seu cocoricó irritante que irá até o sol aquecer suas penas.

         Gosto de coisas antigas; sou saudosista. No entanto, em matéria de despertador, prefiro os modelos atuais. Os de corda ou pilha é só arremessá-los contra a parede e os a energia elétrica, desconectá-los da tomada. Contudo, o diabo do galo, só torcendo-lhe o pescoço; só há um pequeno problema, o galo é do vizinho. Resolvi escrever no jornal pedindo conselhos sobre o que devia fazer a respeito.

         Recebi diversas correspondências, algumas bem interessantes.

         Havia uma, em que o meu conselheiro mandava-me colocar uma venda nos olhos do galo, com isso ele não veria o sol e, portanto, adeus problema.

         Outra, me aconselhava extrair da pobre ave, todos os órgãos responsáveis pelo seu canto.

         Dê uma raposa de presente ao seu vizinho, dizia uma terceira.

         Ponha fone de ouvido e engula um comprimido controlado bastante forte, já que você é o incomodado; eis uma quarta.

         Acorde antes que o galo, e dessa forma ele jamais o acordará.

         Compre um galo mudo e faça a troca com o do vizinho, ele não perceberá a troca, pelo menos até de madrugada.

         Aproveite a oportunidade para ganhar dinheiro, grave o canto do galo e produza um CD com o título “Despertar do campo”, para as pessoas que adoram a vida rural. O seu vizinho, com certeza, compraria um.

         Tire todas as penas do galo, ele sentirá tanto frio de madrugada, que não terá coragem de cantar, além do mais, terá vergonha de ficar pelado na frente das galinhas.

         Faça um abrigo antinuclear e você não ouvirá o galo cantar; pode não ser uma boa ideia, mas rima.

         Implante um chip no cérebro do galo e programe-o para cantar ao por do sol.

         Convide o galo para um banho de cheiro, em vez da banheira, use uma panela de pressão.

         Pelo visto, é apelar para o bom senso do vizinho. E que ele me convide para um almoço de confraternização, onde o cardápio seja galo com tucupi.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

MUNDO PARALELO




Minha mão estendida a pedir esmola.
Seu filho na escola,
à espera de um mundo mais humano.
As nossas chances são poucas.
As nossas vozes estão roucas.

Eu deitado sob um velho banco,
sob o efeito do álcool,
um alucinado sono de uma mísera escolha
pelo dedo indicador de um deus que me acusa por ser racional.       

Uma criança chora de fome,
enquanto os tolos momentos são festejados com brindes e músicas teatrais.
Para nós,
pobres animais
que labutam por toda a sua vida por um futuro melhor
e acabam como um parasita intestinal
que à procura de comida
se digladia em vísceras alheias,
saúde!
A nossa plenitude
acaba no céu da boca de um herbívoro
que mastiga indefinidas vezes a nossa nova forma.

Nada é tão rude quanto o desenvolvimento tecnológico,
que sobre a égide do pensamento humano
comercializa as imagens da miséria planetária.
Somos internacionalmente conhecidos,
seríamos reconhecidos por nossos trapos
e nossos olhos de ressaca,
em qualquer lugar do mundo moderno.

Em rede, não tiramos mais um cochilo,
ao contrário, nos mantemos acordados.
E sob nossa vigília
estão nossos momentos de glória,
a nossa história é reprisada em rápidas cenas do cotidiano.
Talvez estejam nos assistindo agora,
enquanto muda a sua roupa
ou mesmo quando ainda está no banho.

Somos ambíguos,
planejamos uma viajem de férias à lua
e nos matamos na rua
por uma simples dose de ódio.
Quando queremos ver, acendemos as luzes,
quando não,
fechamos os olhos.

Gostamos de marcar nossas covas com cruzes,
elas representam o nosso remorso.
Os nossos bustos são para ativar nossa memória,
não são para aparar dejetos de pombos,
embora pareça o contrário.
Criar canário em gaiola é coisa do passado,
eles agora são empalhados.

Eu ou você
poderíamos correr em volta do planeta,
descalços, seminus, sem comer ou beber;
seriamos manchetes nos jornais,
e além do mais,
teríamos os nossos nomes no livro dos recordes.

Há quem viva em função de uma causa,
e que nada,
nada mesmo, mudaria seu caráter,
a não ser a cadeira do poder.
Eu não quero ouvir dizer,
basta os que sabem que são tolos
e que sábios querem ser.

Abotoem as braguilhas,
dizem os homens de fé,
com a fé em pé de guerra.
Atrasaram meu relógio,
com a bela desculpa de que eu chegaria muito cedo.

Nossa bandeira tremula no palácio.
É alvorada!
Gritava toda a gente.
E na bandeira eu enxugava minhas lágrimas,
descrente.

Algemam crianças em trabalhos forçados.
Aliciam suas pequenas bonecas.
Se digladiam no plenário,
como piranhas em sangue fresco.
E apesar de tudo isso,
ainda querem ridicularizar meu ópio.

O ESCULÁPIO E O POETA



-Não importa quem eu sou.

Antes de falar meu nome,

não esqueça “o doutor”.

Estudei na capital,

não foi no interior.



-Eu não quero ser o tal,

sou apenas um poeta,

me orgulho de quem sou,

minha alma não se aquieta

se em casa não estou.



-Sou jovem e bem sucedido.

Salvarei seu coração

se ficar comprometido.

Controlo a emoção.

Salvo vidas, como médico.



-O poeta é mais modesto.

Só me lembro de um poema

que evitou um suicídio.

De coração não entendo,

só quando muda o sentido.





-Isso sim, não faz sentido,

ter tanta inspiração.

Se fosse um grande poeta,

demoraria na certa,

a fazer versos à mão.



-Orgulhoso ficaria,

se poetinha me chamasse.

Muito mais fez o Pessoa,

se o doutor mais estudasse,

desse fato, saberia.



-Não seja bobo, não ria.

Não tem nada de engraçado.

Sou um homem respeitado.

Muita gente rezaria

pela minha companhia.



-Disso eu não duvidaria.

Na hora da precisão,

todo louco tem razão ,

cada um com sua mania.



-Sou um homem preparado.

Por muitos sou procurado,

quase todo santo dia.

Estou sempre acompanhado

por gente que tem valia.



-Eu tenho por companhia,

o silêncio e a solidão,

ambos trazem poesia

e entregam à minha mão,

meu trabalho é muito pouco,

basta que eu seja louco

e escreva com emoção.



- Finalizemos enfim,

essa nossa discussão.

Como eu sou o doutor,

prova que tenho razão.



- Não digo que sim, que não.

Digo com sinceridade,

como poeta sou louco.

Loucos, sei, não têm razão.

Mas doutor é muito pouco,

pra ser dono da verdade.

SOMOS NÓS DOIS

 Saímos de casa a sós, A procura de nós mesmos. Encontramos um ao outro, Sem temores, nem segredos. Na união de nós dois, Vislumbramos um ca...